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Por: Iara Bispo

Fotos: Caio Alves

Sueli Maria de Sena Soares chegou ao Rodeador, no município de Juazeiro (BA), quando criança, aos 8 anos de idade. Hoje, com 60 anos, ela fala das suas saudades, dores, percas, lembranças e da importância de ser mulher.

Uma força impar e uma coragem de lutar pelo seu lugar. Assim podemos descrever Sueli. Uma mulher que ama o lugar onde vive, apesar de muitas adversidades encontradas pelo caminho. Foi no Rodeadouro, um lugar que um dia ela não quis morar e hoje, nem em pensamento, quer sair. É nesse lugar que ela conquistou seus maiores tesouros como sua família.

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"Esse é meu canto, meu sonho onde construí família e conquistei tudo o que sempre quis. É um sonho morar aqui”, conta Sueli com alegria. “Consegui fazer as coisas que amo, como por exemplo, organizar festejos e participar de manifestações culturais".

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 Ser mulher é muito importante, relata Sueli.  “Importante, pois nos tempos de hoje temos todos os direitos que não tínhamos anos atrás”.  Sueli faz parte de movimentos culturais como: Samba de Véio, Penitencia e Roda de São Gonçalo.

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Na penitencia começou aos 13 anos de idade, fazendo parte do cordão das Alimentadeiras de almas, esse cordão entre homens e mulheres que fazem orações e o nome Alimentadeira de almas é porque alimenta as almas através das orações.

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Ela reflete no seu olhar a dor desse cordão. Lamenta que esteja acabando, ou seja, a religião cultural da penitencia já não é mais como no passado. Ela conta que o cordão era lindo, cheio de pessoas fiéis, a penitencia fervorosa era de vinte 28 a 30 trinta pessoas no cordão. Mas hoje apenas de 8 a 10 pessoas participam.

Quando criança, a vida começou a cobrar de Sueli. Com muita luta, fé e esperança ela e seus três irmãos foram morar com parentes em uma casa de família. Vivia uma rotina pesada. Bem cedinho ia para roça molhar canteiros, carregando lata d´água na cabeça, depois seguia para escola. Na roça plantava coentro, cebolinhas, couve, alface e temperos para vender na cidade. Este  era o meio de sobrevivência e uma forma de ajudar os parentes onde moravam.

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O tempo foi passando e os rumos de sua trajetória ganhando outros ares, pois ao completar vinte anos de idade, Sueli percebeu que as coisas iam melhorar. Conheceu Alexandre Soares da Conceição, se casaram, tiveram sete filhos, cinco homens e duas mulheres, dois faleceram, assim como seu esposo, Alexandre, ela relembra saudosa.

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Mas Sueli ainda tem outro filho de criação, Pedro Henrique que juntamente com ela faz parte do grupo de Samba de Véio do povoado. E os demais filhos fazem parte da penitencia.

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Casada com Alexandre Soares da Conceição, morador de barrinha no Salitre, Sueli conta, com alegria, a felicidade de ter vivido com seu esposo por vinte cinco anos. “Meu casamento foi a melhor coisa que aconteceu. Fui muito feliz. A gente se conheceu aqui no Rodeadoruro mas ele era do Salitre e vinha jogar bola aqui no povoado, nessas idas e vindas dele nos apaixonamos”.

 

Com a mesma felicidade e amor ela retrata uma paixão: gostar de movimento. (Pausa: começarmos a sorrir). Como assim Sueli, movimento? “Isso mesmo. Gosto muito de movimento, festas das crianças e dia das mães, por exemplo, todo ano sou eu quem organizo”. Esse sonho ela carrega com muito afeto e ternura, faz questão de organizar tudo, mas fala que o povoado está esquecido e abandonado pelas autoridades. Isso inquietou Sueli que já se movimentava no sofá, como se estivesse incomodada com a situação que para ela seria mais fácil se as autoridades olhassem e fizessem uma simples quadra de esportes e lazer para a comunidade. Ela relata que luta, arduamente pela comunidade, para conseguir um local de festejos.

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Atualmente, Sueli faz as festas na porta de sua residência todos os anos e esse ano de 2017 os festejos do dia das crianças, por exemplo, foi realizado para mais de 170 crianças entre 0 a 10 anos. Para isso ela conta com a ajuda de moradores do local que colaboram como podem.

Histórico -  Na época de festa ela lembra que muita coisa mudou. Antes, ela sentava na beira da fogueira fazendo brincadeiras e cantando. Não tinha forró. O sanfoneiro era o povo, vizinhos que cantavam. Hoje o povoado tem muitas familiais. Muitas casas e coisas para escolher.

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Emprego - “A renda não é mais a agricultura. Antes era roça. Hoje tá difícil, pois não se planta mais como antes e faltam empregos. Os trabalhos são mais em casa de família ou nas lojas na cidade/ Juazeiro-BA”.

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As dificuldades - “As pessoas que trabalham na ilha estão com dificuldade, pois a baixa do rio está prejudicando o trabalho”.

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Lembranças - “Quando o rio era cheio, os vapores subiam e desciam. Os vapores anunciavam sua chegada apitando e as crianças saiam até a beira do rio para acenar, corriam até não enxercar mais os navios que passavam rumo a Pirapora. Eu sei por que os mais velhos falavam. Às vezes os marinheiros desciam para comer e tomar alguma coisa, era um acontecimento. Lembro como hoje o Saldanha Marinho, as canoas, como a iemanjá, essa sumiu, acabou tudo”.

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Atualidade/movimento/ilha – “Atualmente, o rio não movimenta mais a ilha, acabou. Ao olhar o rio como tá, me dá dó, fico triste em ver a situação dele tão seco”.  Lembra da enchente (saudosa). “Era muita água que atravessava as rampas, as ruas e cobriam as calçadas das casas. Hoje não gosto nem de ir ver o rio”.

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Escola da época dela - “Era só uma sala com os alunos do 1º ao 4º ano. A professora Euvidia atendia a todos até a 4ª série. Não tinha as oportunidades de hoje. Para se formar era preciso ir a Juazeiro, de bicicleta ou montando no jumento ou de carroça. Não tinha ônibus para levar. Só encarava mesmo essa situação para estudar quem queria alguma coisa.”

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