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Por: Mayzze Menezes

Fotos: Caio Alves

Filha mais nova de dois irmãos, Maria Aparecida dos Santos, ou Cida, é conhecida por ser uma das maiores representantes de sua comunidade, o Alagadiço, localizada a cerca de vinte quilômetros do centro da cidade de Juazeiro, na Bahia. 

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Cida tem quarenta anos, e sua memória já mostra sinais de falha, especialmente para se lembrar de datas. Nascida no Alagadiço, ela recorda que sua família morava na beira do rio São Francisco, mas que, com a enchente, se mudaram para a comunidade. Na época, predominavam as casas de barro, e a população foi crescendo com o tempo. 

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Com pouca dificuldade, Cida se lembra de como seus pais contaram sobre o seu nascimento na comunidade do Alagadiço. “Minha mãe me disse que estava perto de me gerar, e meu pai foi chamar a parteira, que morava no Rodeador (outra comunidade da região). Quando ela chegou, era tarde, eu já tinha nascido”. 
 

Durante a maior parte da sua infância, Cida cresceu observando o comportamento e o modo de vida da sua família e das pessoas ao seu redor, enquanto se divertia brincando de roda, bandeirinha e boleado. “Hoje as crianças ficam mais na televisão, mas na época não tinha energia aqui”. 


Segundo ela, sua família trabalhava plantando temperos como cebolinha e coentro. Dessa atividade, sustentavam seus filhos e vendiam os produtos na feira livre de Juazeiro. A situação na comunidade sempre foi precária. Só havia uma escola que oferecia aulas para alunos da primeira à quarta série. “Quando chegava na quinta série, só quem tinha condições de ir até Juazeiro continuava a estudar, porque não tinha ônibus”. A falta de oportunidade fez com que Cida só completasse os estudos aos 25 anos de idade.


Apesar disso, Cida lembra de ter uma infância feliz. Dos momentos mais marcantes da época, ela recorda das festas de São João, onde dançava quadrilha, e do “Samba de Reis”, uma manifestação cultural que movimentava toda a comunidade. “As pessoas se reuniam, iam de casa em casa, entravam lá dentro e começavam a tocar samba”. Infelizmente, essa prática não acontece mais. “Hoje, a única festa popular que tem aqui é a comemoração de Santa Isabel, a padroeira local. Tem as novenas antes, e no dia a procissão, missa, e festa”. 

"Temos que entender que nada vem fácil e que nada se consegue sozinho, tem que ser junto"

Em maio de 2016, a comunidade do Alagadiço foi reconhecida como quilombola. Para isso acontecer, foram necessários esforços e mobilização de toda a população local. Cida foi uma dessas pessoas que contribuiu com a causa, e se sente orgulhosa. “Foi muito importante, porque foi uma forma das pessoas aqui se sentirem representadas como negros, pertencentes a uma história e identidade”.
 
Uma das maiores conquistas desde o reconhecimento como comunidade quilombola foi a chegada de energia elétrica. Mas hoje, apesar de cerca de 50 famílias viverem no Alagadiço, ainda faltam coisas básicas, como creche, posto de saúde e asfalto nas ruas. Outro problema enfrentado por eles é a demarcação de terras. O espaço ocupado hoje pelos moradores não corresponde à área que ocupavam originalmente, por causa de diversos processos de ocupação externa da terra.

 

Para Cida, é necessário mais mobilização para que a comunidade tenha acesso aos seus direitos. “Temos que entender que nada vem fácil e que nada se consegue sozinho, tem que ser junto. Quero ver essa comunidade crescer”, ela diz com esperança. E é com ela que os moradores do Alagadiço vivem dia após dia, sonhando com dias melhores. 

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